domingo, 13 de dezembro de 2009

O significado do fracasso na vida de um cristão

William Lane Craig

Traduzido e adaptado por Leandro Teixeira.

Eu sou cristão há mais de trinta anos. Eu acho que, em minha vida cristã, tomei conta de alguns milhares de serviços da igreja, centenas de serviços religiosos no Wheaton College, e grande número de assembléias cristãs em retiros, conferências, e assim por diante, mantidas pela Campus Cruzade e outros grupos. Ainda durante este tempo todo, eu nenhuma vez- nem uma única vez nas milhares de assembléias nestes mais de trinta impares anos - ouvi um orador discursar sobre o assunto ‘fracasso’. Na realidade, eu provavelmente não refletiria seriamente no problema se não tivesse um fracasso esmagador que me impeliu a enfrentar o problema pessoalmente.

A falta de tratamento deste assunto, por parte de oradores cristãos, não é devido a qualquer falta de importância do assunto. Qualquer cristão que fracassou em algum momento sabe quão devastadora a experiência pode ser e as perguntas que surgem são: Onde Deus está? Como Ele pode deixar isto acontecer? Eu estou fora da vontade dele? O que eu faço agora? Deus realmente se preocupa ou existe? Essas são perguntas agonizantes. Qual é o significado de fracasso para um cristão?

Tratando deste problema, me parece que nós precisamos primeiro distinguir dois tipos de fracasso: fracasso na vida cristã e fracasso na vida de um cristão. Por fracasso na vida cristã, eu quero dizer um fracasso do crente no relacionamento e na caminhada com Deus. Por exemplo, um Cristão poderia sofrer decepção e fracasso devido a uma rejeição em atender a chamada de Deus, ou sucumbindo à tentação, ou por se casar com um não-cristão. Fracasso deste tipo se deve ao pecado. É essencialmente um problema espiritual, uma questão de moral e fracasso espiritual.

Diferentemente, o fracasso na vida de um cristão não tem relação com considerações espirituais. Não se deve ao pecado na vida de um crente. É uma derrota pessoal que sucede no viver diário da experiência cristã. Por exemplo, um homem de negócios cristão poderia falir, um atleta cristão poderia ver seus sonhos juvenis despedaçados quando ele falha em passar para a Liga Principal, um estudante cristão poderia fracassar na escola apesar dos seus melhores esforços para ter sucesso, ou um operário cristão poderia se achar desempregado e incapaz de conseguir um emprego. Tais casos não são exemplos de fracasso na caminhada de uma pessoa com Deus, mas exemplos de fracasso no curso ordinário da vida. Eles acontecem nas vidas das pessoas que são cristãs.

No livro best-seller Fracasso: A Porta dos fundos para Sucesso, Erwin Lutzer trata da distinção que eu estou tentando fazer aqui. Ele atribui o fracasso na vida cristã à cobiça da carne (satisfação sexual), ao orgulho (egoísmo), ou à luxúria (cobiça). Fracasso na vida de um cristão que não está relacionado a esses elementos faz parte da vida. Lutzer não encontra nenhuma dificuldade particular com o segundo tipo de fracasso, mas ele considera o primeiro tipo de fracasso problemático. Ele escreve:

O que causa fracasso? O que faz um homem chegar ao final da vida e admitir que viveu em vão? O que motiva um homem para se suicidar porque ele não é tão talentoso quanto os outros? O que faz um homem arriscar o seu testemunho cristão e ter um caso com a esposa do seu vizinho? A resposta: Pecado - especificamente, orgulho, cobiça ou desejo sensual.

Naturalmente, há fracassos bastantes sem conexão com motivações pecadoras: um estudante poderia fracassar na escola, um homem poderia fazer um investimento pouco inteligente. Muitas pessoas têm fracassado nos seus trabalhos ou simplesmente não alcançaram suas metas. Nós não devemos minimizar este tipo de fracasso, mas no final das contas não é tão sério quanto o fracasso espiritual.1

Lutzer dedica o livro inteiro dele ao fracasso na vida cristã, o primeiro tipo de fracasso, porque ele pensa que este tipo de fracasso tem conseqüências mais sérias que o segundo tipo de fracasso. Em um sentido é verdade: a pessoa é moralmente culpada pelo fracasso devido ao pecado. Fracasso na vida cristã quebra o companheirismo da pessoa com Deus e tem conseqüências eternas. Nós precisamos confessar este tipo de fracasso a Deus ou nós seremos responsabilizados e julgados por isto. Assim, em última instância, as conseqüências do fracasso na vida cristã são mais sérias que os fracassos ordinários que acontecem em nossas vidas.

Por outro lado, contudo, em termos de conseqüências cotidianas no mundo no qual nós vivemos, não é sempre verdade que o primeiro tipo de fracasso tem as conseqüências mais sérias. Por que se nós não soubermos responder corretamente a eles, o fracasso na vida de um cristão pode devastar mais até mesmo do que o fracasso que ocorre especificamente por causa de nosso pecado.

Agora eu não tenho nenhuma dificuldade particular em compreender o fracasso na vida cristã. Naturalmente, pecado resulta em fracasso! Que mais nós poderíamos esperar? Nem a solução a este tipo de fracasso é difícil entender: arrependimento, confissão, fé e obediência. Assim eu não considero o fracasso na vida cristã confuso, especialmente quando eu reflito na fraqueza de minha própria carne. Não é surpreendente que nós pequemos e falhemos.

Mas o segundo tipo de fracasso é problemático pra mim. Quando alguém está caminhando em fé e obediência a Deus, como ele pode ser conduzido à cova do fracasso? Pense nisto. Como posso ser conduzido ao fracasso obedecendo a Deus? Realmente, isto é confuso. Então, eu quero focalizar nossa atenção neste segundo tipo de fracasso, o fracasso na vida de um cristão, e ver se nós podemos vir a entender isto.

Por muitos anos eu tive o ponto de vista que cristãos que estão caminhando com Deus basicamente não podem fracassar. Talvez eu fosse excessivamente ingênuo, mas eu não penso assim. Eu havia levado em conta a questão e havia até mesmo qualificado minha posição em vários pontos importantes. Por exemplo, eu distingui fracasso de perseguição. A Bíblia é clara que pessoas que estão tentando para viver vidas religiosas em Cristo Jesus experimentarão perseguição, e Jesus disse que eles serão abençoados por isto. Cristãos que morreram em campos de concentração por causa da sua fé ou que perderam trabalhos ou foram discriminados porque eles eram cristãos, não se pode dizer que fracassaram.

Eu também distingui fracassos de provações. A Bíblia é clara que como cristãos nós não somos isentos de provações e que tais provações produzem maturidade e perseverança. Sem provações nós permaneceríamos crianças mimadas e despreparadas. Mas eu acreditei que, se nós suportássemos nossas provações confiando na força de Deus, Ele nos veria e nos traria vitoriosamente ao outro lado. Basicamente, não tinha sentido, pra mim, dizer que Deus chamaria uma pessoa para fazer algo e então - quando aquela pessoa fosse obediente ao chamado e estivesse confiando na força de Deus - lhe permitisse fracassar.

E, de fato, há algum apoio Bíblico para a posição que eu tomei. Olhe o que o Salmo 1:1-3 diz:

“Bem-aventurado o homem que não anda segundo o conselho dos ímpios, nem se detém no caminho dos pecadores, nem se assenta na roda dos escarnecedores. Antes tem o seu prazer na lei do SENHOR, e na sua lei medita de dia e de noite. Pois será como a árvore plantada junto a ribeiros de águas, a qual dá o seu fruto no seu tempo; as suas folhas não cairão, e tudo quanto fizer prosperará.”

O que poderia ser mais claro? Em tudo que ele faz, prospera! Entretanto, eu sofri um fracasso pessoal desastroso que me forçou a repensar nesta passagem inteira. Aconteceu enquanto Jan e eu estávamos morando na Alemanha Ocidental e eu estava terminando meu doutorado em teologia na Universidade de Munique, sujeito à orientação do famoso teólogo Wolfhart Pannenberg. Minha dissertação já havia sido aprovada e tudo que restava era passar no exame oral em teologia (ominosamente chamado o Rigorosum). Não sabendo o que esperar, eu tentei conseguir, repetidas vezes, uma entrevista com Pannenberg para discutir o exame e como eu poderia me preparar para ele. Mas eu não tive sucesso em vê-lo (professores alemães tendem a ser muito mais reclusos que as suas contrapartes americanas). Assim, eu fui ao seu assistente, um jovem e brilhante teólogo que havia ganho o doutorado dele sujeito a Pannenberg. Ele ignorou a idéia de me preparar para o exame. “Esqueça!” ele avisou. Bem, eu não era estúpido, assim eu o pressionei mais sobre como eu poderia preparar. “Pannenberg sempre faz só perguntas em cima dos próprios escritos”, ele respondeu. “Basta ler o que ele escreveu.”

Aquilo me parecia ser uma boa estratégia, e então durante as várias semanas seguintes eu li e estudei virtualmente tudo o que Pannenberg já havia escrito. Eu me sentia confiante de que havia dominado o pensamento dele.

No dia do exame eu entrei no escritório de Pannenberg. Ele entregaria o seu exame, e o processo seria monitorado e seria registrado pelo reitor da faculdade de teologia e um outro professor de teologia. Nós demos um aperto de mão e nos sentamos para o interrogatório começar.

Quase imediatamente coisas começaram a dar errado. Pannenberg começou a fazer perguntas sobre assuntos que não foram discutidos nos escritos dele. Ele começou a perguntar pelas particularidades da teologia deste ou daquele homem. E eu não pude responder as perguntas. Novamente eu tive que confessar minha ignorância. Eu não posso transmitir a você o sentimento de desamparo e medo que me varreram. Pergunta após pergunta, eu percebi que estava assistindo meu diploma de doutorado fugir, e – tal como tentar agarrar areia que desliza pelos seus dedos - não havia nada que eu pudesse fazer para parar isto. Esta tortura continuou por quase uma hora. Próximo ao término do tempo da prova, somente para fazer meu fracasso ser patentemente evidente, Pannenberg fez um par de perguntas condescendentemente fáceis, como para se rebaixar ao meu nível de conhecimento. Minha humilhação estava completa.

Desolado, eu deixei o departamento de teologia para encontrar Jan e sair para jantar em um restaurante onde nós dois havíamos planejado celebrar. Ela veio apressada a mim, sorrindo, com um olhar de expectativa nos olhos. “Mel - eu fracassei”, eu disse. Ela não podia acreditar. Era logo antes o Natal e no dia 23 nós havíamos planejado voar de volta aos Estados Unidos para visitar minha família e começar a ensinar na Trinity Evangelical Divinity School em Deerfield, Illinois, depois do Ano novo. Agora, nós íamos para casa em derrota. Como que para adicionar injúria ao insulto, no vôo de volta, a Lufthansa perdeu nossa máquina de escrever da IBM, a bolsa da Jan, que estava cheia de valiosas jóias, foi roubada e eu perdi minhas lentes de contato!

Mas essas perdas materiais não eram nada comparadas ao tumulto que eu sentia dentro de mim por perder meu doutorado. Eu não entendia como Deus podia ter deixado isto acontecer. Ele havia nos chamado para a Alemanha e milagrosamente havia provido as finanças para meu estudo. Nós estávamos caminhando na vontade Dele; eu estava certo disto. Eu não havia sido negligente ou super confiante. Eu tinha tentado freqüentemente ver Pannenberg com antecedência, mas ele sempre estava muito ocupado para mim, assim, eu me preparei do melhor modo que eu sabia. Mas especialmente, nós tínhamos orado seriamente e fielmente para este exame e havia outros, cristãos cheios do Espírito nos Estados Unidos, orando para isto também. O exame foi completamente justo, eu não podia negar isso. Eu fracassei, isso é tudo. Mas como Deus podia ter deixado isto acontecer? E as promessas dele? “e tudo quanto fizer prosperará”.”Tudo que você pedir em meu nome…”.

Não era só o meu fracasso no exame. Mais que isto, meu fracasso foi uma crise espiritual na fé para mim. Eu sentia dor e vergonha, mas até mesmo mais, eu me sentia traído por Deus. Como eu poderia confiar novamente nEle?

Como eu trabalhei meus sentimentos nos dias seguintes, ficou claro a mim que Salmos 1:1-3 não pode ser interpretado como algum tipo de promessa geral que ampara todo caso. Cristãos sem sempre prosperam no que eles empreendem. Às vezes eles fracassam, e isso é fato.

Agora alguém poderia dizer, “Você não pode usar experiência humana para anular a Palavra de Deus! As promessas dele são indiferentes a sua experiência”.Mas o problema com esta resposta é que a Bíblia dá exemplos de tais fracassos. Por exemplo, Deus havia prometido dar a terra de Canaã às doze tribos de Israel. Mas em Juízes 1:19, nós lemos, “E estava o SENHOR com Judá, e despovoou as montanhas; porém não expulsou aos moradores do vale, porquanto tinham carros de ferro”.Olhe para o que diz aqui: o Deus estava com os exércitos de Judá - mas apesar deste fato, embora eles tivessem conquistado a colina do país, eles não derrotaram o inimigo deles nas planícies porque eles tinham carruagens férreas! Não parece fazer sentido: Deus estava com eles e mesmo assim fracassaram. Como nós compreendemos tal fracasso na vida do crente?

Agora algumas pessoas poderiam responder essa pergunta afirmando que Deus não tem nenhuma vontade específica para nossas vidas. A vontade geral de Deus é que nós obedeçamos a seus comandos éticos e espirituais, que nós nos aproximemos do caráter de Cristo, e assim sucessivamente. Mas Ele não tem nenhuma vontade específica para pessoas individuais que incluem conseguir um doutorado, se casar com certa pessoa ou entrar em um negócio empresarial particular. Assim quando nós empreendermos essas coisas, nós fazemos tão completamente por nossa própria iniciativa e bem pode virar em fracasso.

Mas esta solução me parece inadequada, apesar de sua aparente simpatia para muitas pessoas. Em primeiro lugar, insinua um conceito deficiente da soberania, providência e orientação de Deus. Embora a Bíblia ensine liberdade humana, também tem uma forte ênfase no controle soberano de Deus e direção providencial sobre tudo o que acontece. Nada acontece no mundo sem que Deus ou deseje diretamente, ou, no caso de atos pecadores, seja pelo menos permitido. Além disso, Deus tem organizado o mundo tão providencialmente que os fins dele serão realizados pelas coisas que nós decidimos empreender. Nossas decisões, então, não podem ser problemas indiferentes a Ele. Além disso, Ele prometeu nos guiar no que decidimos. Tudo isso sugere que Deus tenha uma vontade específica para nossas vidas.

Mas deixando este ponto de lado, em segundo lugar, a solução proposta atualmente não vai, de fato, ao coração do problema. Mesmo que Deus não tenha uma vontade específica para nossas vidas, ainda resta que Ele prometeu estar conosco, nos capacitando e nos ajudando. Isso é porque o exemplo em Juízes é tão confuso. Deus estava com eles, mas ainda assim fracassaram. Então, mesmo se Deus não tiver nenhuma vontade específica para nossas vidas, aquele silêncio não explica como nós podemos fracassar em coisas que nós decidimos fazer na força Dele.

E assim eu fui conduzido ao que era, para mim, uma nova e radical idéia da vontade de Deus, a saber, que a vontade de Deus para nossas vidas pode incluir fracasso. Em outras palavras, a vontade de Deus pode querer que você falhe, e Ele pode te conduzir ao fracasso! Pode haver coisas que Deus tem que te ensinar com fracassos que Ele nunca poderia te ensinar com sucessos.

No meu próprio caso, fracassar em meus exames doutorais forçou-me a ver as prioridades de minha vida sob uma nova luz. Quando nós voltamos aos meus parentes para o Natal, eu dei as notícias a meus pais de que eu havia falhado em meu exame oral e não recebi o doutorado. Para minha surpresa, replicou minha mãe, “Quem se preocupa?” Eu fiquei atordoado! Para mim parecia a catástrofe da minha existência, mas ela só encolheu os ombros como se não importasse. Começou a manifestar-se em mim que, em um sentido, não importava mesmo, que há coisas na vida muito mais importante que doutorados, publicações, e fama acadêmica. No fim, são as relações humanas que realmente importam - especialmente as familiares.

Minha mente voltou-se para um cientista que havíamos encontrado na Alemanha, que estava há muitos anos divorciado e que quis com todo o seu coração voltar à sua esposa e filhinho. “Quando eu era recém-casado”, ele nos falou, “eu gastei todo meu tempo no laboratório. Tudo do que eu poderia pensar era minha investigação, à exclusão de qualquer outra coisa ou qualquer outro”. Parecia tão importante a ele, então. Mas agora ele soube que não era. “Eu fui um bobo”, disse ele. E assim, eu também percebi agora, mais uma vez, as bênçãos que eu tive em uma esposa fiel que havia se sacrificado e trabalhado comigo todos esses anos em que eu estive na escola; e nos pais amorosos que me aceitaram, incondicionalmente, só porque eu era o filho deles. Aquele Natal marcou o começo de uma nova relação com meus parentes. Jan e eu viemos os conhecer não somente como pais, mas como amigos.

Veja, eu realmente não tinha entendido o que o verdadeiro sucesso é. Verdadeiro sucesso não é alcançar riqueza, poder ou fama. O verdadeiro sucesso está no reino do espiritual, ou mais especificamente, está em conseguir conhecer melhor a Deus. J. I. Packer expressa sucintamente este pensamento em Conhecendo Deus:

Nós fomos trazidos ao ponto onde ambos podemos e devemos obter as prioridades de nossa vida de forma definida. Das publicações cristãs atuais você poderia pensar que o item mais vital para qualquer verdadeiro ou pretenso Cristão no mundo hoje é a união da igreja, ou o testemunho social, ou o diálogo com outros cristãos e outras fés, ou refutando este ou aquele “ismo”, ou desenvolver uma filosofia ou cultura cristã, ou o que você quiser. Mas nossa linha de pensamento faz com que a atual concentração nestas coisas se pareça com uma conspiração gigantesca de má direção. Naturalmente, não é isso; os seus problemas são reais e devem ser tratados no seu lugar. Mas é trágico que, dando atenção a eles, tantos de nossos dias pareçam tirar a atenção do que era, é e sempre será a verdadeira prioridade para todo ser humano – isto é, aprender a conhecer Deus em Cristo.2

A primeira vez que eu li esta declaração, me surpreendi: “refutando este ou aquele “ismo” ou desenvolvendo uma filosofia cristã.” Exatamente o tipo de coisa que eu faço na vida! E ainda não é o mais importante. A pessoa poderia ter sucesso nisto e ainda, na visão de Deus, ser um fracassado.

Isto me trouxe à mente um pensamento que Lutzer disse que veio assombrá-lo, sendo ele um pastor ocupado: “Você pode não estar realizando tanto quanto você pensa que está.” Nós podemos estar fazendo muitas coisas para Deus e ainda não ser o tipo de pessoa que Deus deseja que nós sejamos. Realmente, meu maior medo é que eu poderia algum dia me colocar diante de Deus e ver todos meus trabalhos subirem em fumaça como “madeira, feno e palha.” Afinal de contas, o que disse Jesus? - “Os primeiros serão os últimos e os últimos serão os primeiros.” Não é nenhum sucesso aos olhos do mundo que, no final das contas, interessa, mas o sucesso aos olhos do Deus.

Agora estou animado e convicto. Por um lado, animado porque embora nós fracassemos, o fracasso pode ser a melhor parte do sucesso aos olhos de Deus. Eu tenho uma intuição de que Deus não se interessa tanto pelo que nós passamos quanto por como nós passamos pelos fracassos. Embora possamos falhar na tarefa que temos a intenção de fazer, se respondemos àquele fracasso com fé, coragem e dependência na força do Deus, ao invés de desespero, amargura e depressão, será contabilizado como um sucesso nosso na visão dele.

Por outro lado, estou convicto porque podemos pensar que nós estamos realizando muito, quando de fato estamos fracassando na visão do Deus. O apóstolo Paulo reconheceu que ele podia ser um teólogo brilhante e talentoso, que vivesse em pobreza por causa da sua generosidade e fosse martirizado até mesmo por pregar o evangelho, e ainda, se lhe faltasse amor, não seria nada na visão de Deus. O verdadeiro sucesso é encontrado em amar a Deus e a nossos próximos.

Bem, que aplicação prática tem tudo isso para nossas vidas? Podem ser dadas duas opiniões.

Primeiro, nós precisamos aprender com nossos fracassos. Quando fracassamos, nós não deveríamos adotar a atitude de ‘uvas azedas’ da raposa, na fábula de Esopo. Ao invés, nós deveríamos analisar nosso fracasso para ver que lição podemos aprender dele. Isso não significa tentar entender por que Deus permitiu isto acontecer. Em muitos casos, nunca saberemos o porquê. Muitos cristãos entram no que Packer chama de “erro da caixa sinalizadora York.”3 A malha ferroviária na cidade de York tem uma sala de controle principal que contém um painel eletrônico que exibe em luzes a posição de todo trem na malha. Alguém na torre de controle, que vê o painel inteiro, pode entender justificadamente por que um trem particular foi posto em espera em um ponto, ou porque outro foi movido para outro lugar em um desvio, embora para alguém, lá embaixo nos trilhos, os movimentos dos trens possam parecer inexplicáveis. O Cristão que quer saber por que Deus permite todo fracasso na vida dele está solicitando, Packer diz, estar na “caixa sinalizadora” de Deus, mas ainda, para melhor ou para pior, nós não temos acesso a ela. Então, é insensato torturar a si mesmo por querer saber o porquê que Deus permitiu este ou aquele desastre entrar em nossas vidas.

Mas posto que nós nem sempre discernimos ou compreendemos o projeto providencial de Deus, ainda podemos aprender com nossos fracassos. Como diz Lutzer, “não é necessário saber por que Deus nos enviou o infortúnio para ganhar com ele.”4 Pergunte a si mesmo o que você podia ter feito diferentemente em sua situação ou o que poderia fazer diferentemente da próxima vez. Pergunte a si mesmo que tipo de reação Deus quer que você tenha, ou que característica de caráter pode ser desenvolvida em você como resultado da derrota. Aprenda de seu fracasso.

Segundo, nunca se renda. Só porque você fracassou, não está tudo perdido para ti. Aqui, o exemplo de um homem como o Presidente Theodore Roosevelt é instrutivo. Fraco e doente como um menino, Roosevelt batalhou para alcançar grandes coisas, o único Presidente a ser homenageado com a Medalha Parlamentar de Honra pelo seu valor no campo de batalha. Roosevelt declarou,

O crédito pertence ao homem que está de fato na arena, cuja face é arruinada pelo pó, suor e sangue; que se esforça valentemente; que erra, que fracassa repetidas vezes, porque não há nenhum esforço sem erros e falhas; mas que se esforça para fazer as obras; que identifica os grandes entusiasmos, as grandes devoções; que gasta a si mesmo em uma causa merecedora; que na melhor das hipóteses conhece, no final, o triunfo de uma grande façanha, e que na pior das hipóteses, se fracassar, pelo menos fracassa com grande coragem, de forma que o lugar dele nunca estará com essas almas frias e tímidas que nem não conhecem vitória nem derrota.

Você não está liquidado só porque fracassou. Você só está liquidado se render e desistir. Mas não desista! Com a força de Deus, apanhe os pedaços de seu fracasso e, havendo aprendido disto, vá adiante.

Isso é o que nós fizemos em nosso caso. Em universidades alemãs, se você abandonar os exames orais na primeira vez, você pode retomar. Jan e eu soubemos que podíamos tentar novamente, e nossos amigos nos encorajaram para que o fizéssemos. Assim, depois de começar a ensinar na Trinity, eu passei o próximo ano inteiro preparando-me novamente para o Rigorosum. Eu estudei completamente a prodigiosa obra de Harnack, de três volumes do Dogmengeschichte, a História do Desenvolvimento de Doutrina multi-volume de Pelikan, a História de Doutrina cristã Cunliffe-Jones, Dogmengeschichte de Loof, dois extensos guias de estudo em geral de Teologias dogmáticas preparadas para estudantes de universidade alemães em teologia, como também estudei os documentos dos vários conselhos e credos da Igreja, leituras dos Pais da Igreja, trabalhos de teologia contemporânea, e assim sucessivamente. Passado o tempo de um ano, eu tinha uma pilha de notas, a qual eu havia virtualmente memorizado e estava preparado para responder perguntas em qualquer área da teologia sistemática - seja cristologia, antropologia, soteriologia, ou tudo isto - dos antigos Apologistas aos da Idade Média, da Reforma, do Iluminismo e do século XX. Eu estava pronto. Mas estava morto de medo.

Nós voltamos à Alemanha no verão seguinte, e deixei Jan em Berlim enquanto viajei de trem para Munique, para o exame. Quando entrei no escritório de Pannenberg, tudo aparentava estar quase a mesma coisa de antes. Mas desta vez, era diferente. Pannenberg começou com a doutrina da Trindade, iniciando com a doutrina do Verbo dos Apologistas antigos. E para minha alegria (a qual eu mal podia esconder!), como o exame continuou a desdobrar-se, eu me achei respondendo prontamente a cada pergunta com respostas completas e precisas. A única pergunta na qual tropecei era uma sobre por que a doutrina de Hegel da encarnação requeria a morte de Deus - e eu não me senti tão mal por perder aquela! O próprio Pannenberg estava claramente encantado com meu sucesso e me premiou com um de magna cum laude no exame. Eu estava dançando no ar!

Assim, foi uma vitória para Deus, no fim. Mas a vitória não foi somente passar no exame. Foi a fim de, sem mencionar as lições espirituais que Deus me ensinou, eu descobrir uma verdade muito sensata. Como tantos outros estudantes americanos, eu havia sido angustiadamente treinado em seminário na história da doutrina cristã. A formação em teologia sistemática que os seminários evangélicos americanos geralmente dão para os seus estudantes é apenas uma sombra pálida do que estudantes universitários alemães de teologia recebem. É, então, alguma maravilha a cética teologia alemã moldar o mundo? Como nós podemos esperar que teologia evangélica se torne um modelo principal a menos que nós comecemos a treinar nossos estudantes com o mesmo rigor e eficácia que caracterizam a instrução teológica alemã? Eu posso dizer, sem hesitação, que durante aquele ano de intenso estudo, eu aprendi mais sobre teologia sistemática do que durante minha formação de seminário inteira. Assim, embora eu nunca quereria reviver minha experiência, eu posso dizer honestamente que eu estou alegre que eu fracassei. Era para o melhor, porque como resultado daquele fracasso eu fui equipado teologicamente de certo modo para o serviço do Deus que nunca teria sido possível se eu tivesse passado.

E eu estou muito alegre por não termos desistido. Suponha que tivéssemos nos rendido. Digamos que na humilhação do meu fracasso, eu tivesse perdido a esperança e não tivesse tentado prestar o exame pela segunda vez. As dores agudas de derrota teriam me assombrado toda vez eu pensasse em meu fracasso ou abrisse um livro de teologia sistemática. Eu não teria tido aquele ano de estudo intensivo e eu teria permanecido em meu estado anêmico de conhecimento teológico. Os anos teriam passado e eu teria me feito continuamente a pergunta: Eu deveria ter tentado novamente? Até mesmo se eu tivesse tentado e tivesse abandonado a segunda vez, eu ainda teria sido melhor se desisitisse. Parafraseando um velho lema em um contexto diferente: É melhor tentar e ter fracassado do que não ter tentado.

Assim, quando você encontrar o fracasso, não se renda. Peça a força de Deus para ir além. Ele a dará a você. Na realidade, há um nome bíblico para esta qualidade. É chamada de perseverança. Pelo fracasso, se você responder corretamente, Deus pode construir a qualidade da perseverança em sua vida.

O fracasso na vida de um Cristão, então, não deveria nos pegar de surpresa. Deus tem coisas importantes para nos ensinar pelo fracasso - e o verdadeiro sucesso, o sucesso que conta para eternidade, consiste em aprender essas lições. Assim, quando você fracassar, não se desespere ou pense que Deus o abandonou; antes, aprenda de seus fracassos e nunca se renda. Esta é a fórmula para o sucesso.

Notas

1 Erwin Lutzer, Fracasso: A porta dos fundos para o sucesso (Chicago: Moody, 1975), pp. 41-42.

2 J. I. Packer, Deus onisciente (Londres: Hodder & Stoughton, 1973), p. 314.

3 Ibidem., pp. 110-11.

4 Lutzer, Fracasso, p. 66.

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